EDITORIAL: a derrota se anunciava desde o Hino Nacional

Esse tema vem guardado a algum tempo, aguardando momento oportuno para ser escrito. E não há melhor momento que esse: a ressaca do porre de realidade que se abate sobre nós brasileiros após a Copa do Mundo da FIFA 2014. Tentei de várias maneiras abstrair-me e manter distância desse malfadado evento esportivo. Confesso que não consegui; assisti a vários jogos. Nos jogos da seleção nacional a reunião familiar era grande e intensa onde eu, por vezes quase consegui tocar a paixão que emanava daquelas pessoas compenetradas naquelas disputas de cartas marcadas. Confesso também que mesmo torcendo para que o Brasil perdesse, ficava nervoso quando o time brasileiro sofria ataques. Era latente que meu subconsciente estava torcendo à favor, enquanto meu consciente torcia contra [motivos mais à adiante] e isso me fazia tremer em certos momentos mais contundentes das partidas.

Como disse acima, torci contra a seleção. Sei que muitos ignorantes deixarão de ler aqui o texto ao mesmo tempo que me cobrem de impropérios. Mas se você continua interessado no que tenho a dizer, agradeço a atenção ao passo que exponho os motivos que causaram essa dualidade oposta [torcer / não-torcer]: o primeiro momento que me fez alertar foi o choro de alegria [hoje vejo que pelos rios de dinheiro que escoariam para os bolsos enlameados com a mais pura corrupção] do então presidente da república Lula há mais ou menos 10 anos atrás. Assim como a maioria dos pensadores brasileiros, achava eu que o país detinha tantos mais problemas urgentes, que esse negócio de copa era coisa a ser pensada e questionada somente depois, afinal o futuro ainda encontrava-se longe do alcance da imaginação e as promessas era que a iniciativa privada ficaria à cargo do capital de investimento...



Lula saiu podre de rico assim como seu filho, que de reles programador assalariado hoje é grande acionista da Oi e da Friboi; de herança nos deixou Dilma que desandou o que já estava ruim uma vez que, assim como seu mentor 9 dedos, governa para um partido e não para o país muito menos para o povo. E como bons brasileiros, deixamos para prestar atenção na tal da copa em cima da hora. Só aos 45 do segundo tempo percebemos que quem estava pagando tudo, incluindo os 12 estádios bilionários e seus respectivos superfaturamentos [que darão retorno apenas para poucos e muito bem escolhidos bolsos aveludados], eramos nós. E com um plus: um gigantesco nariz de palhaço imaginário, porém não menos real.



Nosso país vive à deriva nos sentidos cultural, político e social. Se nossas instituições não funcionam, matam-se 50 mil brasileiros por ano, nossas crianças alienadas e distantes da realidade inteligível desde que conseguem apresentar os primeiros sinais de desenvolvimento cognitivo, se nós adultos nos encontramos voluntariamente presos em vaidades egocêntricas, entregues à corrupção da carne e da alma servindo de engrenagem para um sistema brutal comandando por bilionários dentro da política, indústria, meios de comunicação, enfim do Estado em seus diversos segmentos, a culpa é minha. A culpa é sua. É para isso que servimos então? Para que trabalhamos? Acordamos e dedicamos nossas melhores horas do dia ao ganha-pão diário apenas para adquirir bens materiais, em sua maioria supérfluos para nossa sobrevivência enquanto milhões morrem ou vivem de maneira degradante sem conhecimento nenhum sobre nada? Devemos ser coniventes com a vida sem dignidade? Não. Temos que assumir nossa parte na guerra contra o mal. Seja na linha de frente, seja na retaguarda ou na inteligência. 

Além da visão fisicamente palpável através dos olhos, o ser humano é dotado de uma visão mental, que alguns estudiosos atribuem a uma maior capacidade de percepção da realidade ao seu redor. Portanto, dada a diversidade da natureza na qual a espécie humana é parte, é lícito partir do pressuposto que algumas pessoas possuem um maior alcance de percepção do que outras, nada impedindo que estes possam, através de informações, vislumbrar a mesma realidade. Eu inclusive, não que isso importe a quem quer que seja, me considero uma pessoa de percepção média, porém de uma curiosidade alta, compensando as deficiências com leitura e reflexão.



Leitura e reflexão. Se apenas atividades abstratas para a uns, para a maioria é ainda mais evanescente, no mais, é coisa de viado. Graças a insistência de seres pensantes notáveis que naturalmente não deram ouvidos ao senso comum das pessoas da época e trilharam caminhos inovadores, a humanidade conseguiu estabelecer a ordem em grande parte do mundo. Com o estabelecimento dessa ordem, as disputas passaram a ser no campo desportivo e o futebol sempre se destacou por ser um esporte de popularidade considerável em vários países do mundo, em todos os continentes. O futebol atual, com um campo pintado, com regras escritas foi forjado pelos ingleses, porém desde os povos maias, incas e astecas que se jogava uma espécie de `futebol´ num descampado possuído de traves de madeira não tão grandes quanto as atuais e, usando como bola cabeças de inimigos. Macabro. Futebol sempre foi algo que envolveu poder e sangue; que o diga o zagueiro colombiano Andrés Escobar morto a tiros semanas depois de fazer um gol contra na copa do mundo de 1994... 


Por isso que o futebol é um sucesso mundial: a maioria de nossos antepassados, já jogaram algo parecido com futebol numa época em que significava mais sangue e mais poder que hoje. Está gravado em nosso subconsciente em auto-relevo. Durante a Copa das Confederações, foi que comecei a me pegar matutando sobre o assunto. Hospitais em frangalhos, escolas desabando, estradas carcomidas pelas intempéries e auxiliadas pelo uso de material ruim na construção [e nós não estamos na faixa de Gaza, aparentemente] e ninguém, muito menos os ministérios públicos da vida, demonstram menor sinal de preocupação mas idolatram, falam, rezam, realizam promessas e até sucumbem à melancolia quando a vitória não vem comecei a perceber que a seleção que nesse momento desperta tanta admiração e idolatria para com os jogadores serve apenas para render milhões para grandes companhias dos mais variados setores [da indústria, comércio, serviço] e para os jogadores individualmente falando... Vivenciar tanta desgraça e perceber que quase ninguém estava preocupado em fazer algo para mudar a si e  a realidade ao redor, ao passo que os nossos "representantes" de Brasília estão, popularmente falando: cagando e andando para o país, abate qualquer pensamento positivo de buscar mudanças.


Na rebarba da sipuada, sobra até para os mortais jornalistas, narradores, radialistas, comentaristas e etc. que ganham a vida analisando essa grande farsa. Depois do choro de crocodilo de Lula, outro fato que me comoveu a torcer contra para que nosso povo se desprendesse de subterfúgios de baixa cultura como por exemplo esse esporte manipulado em sua maioria das vezes, foi a falta de conhecimento do hino nacional. Percebi durante a copa das confederações que boa parte dos jogadores não sabiam cantar o hino e ficavam numa embromação asquerosa que beira o cúmulo da pior dublagem mexicana. Como querer elevar um time de futebol a representante da República do Brasil, sem que o país e o time entrassem em concordância pelo menos no hino? Talvez se fosse um funk, um pagode, um sertanejo-universitário todos cantassem em uníssono e no mesmo tempo?!



Ser patriota naqueles dias era torcer para seleção de futebol. Isso me deixava inquieto por dentro, ainda mais quando o governo começou a tirar proveito da situação. Era muita baixeza. Auxiliado pela Globo, o governo federal praticamente "apadrinhou" a seleção e a tomou como exemplo do uma ótima gestão a realização da copa e que iria ganhá-la, simplesmente porque queria ganhá-la. Porém não se ganha copa nem muito menos se governa um país sem planejamento isento de roubos e desvios. Durante o evento esportivo, foi ficando cada vez mais óbvio que realmente o governo tinha muito haver com o time da CBF, pois não tinha comando além de exalar um individualismo altamente nocivo para um esporte coletivo como o futebol, isso sem citar analogias às irregularidades escabrosas feitas por João Havelange, Ricardo Teixeira, José Maria Marin, assim como o país é governado a anos por Sarney, Renan Calheiros, Lulas da vida, etc.. 


Como não havia mais como distinguir entre time de futebol e país, cheguei a irrisória conclusão: se o time brasileiro perder essa maldita copa, Dilma terá grandes chance de perder as eleições de outubro; Roussef arriscou tudo em propagando estatal mentirosa vendendo uma imagem de eficiente que ruiu como cabana em vendaval com o enorme fracasso da gestão que ela tinha como um braço do governo na vitrine do mundo; boa parcela do povo já começa a perceber que na prática é muito mais marketing e desvio de verbas que qualquer outra coisa. E assim foi feito, aquele desastre que se anunciava desde a execução do hino, loucamente acompanhado pelos bêbados das arquibancadas que cantavam a bancarrotas, atropelando a cadência e uns aos outros e o próprio hino, se consumou na vexatória derrota de 7x1 para a Alemanha que, merecidamente ganhou porque treinou, estudou, leu, se adaptou e conquistou o Brasil, de uma maneira que nem mesmo eu eu você fazemos, vivendo com intempestiva curiosidade nossas raízes mais remotas.


Além do título de melhores de mundo da bola, os germânicos levam consigo o respeito e admiração dos brasileiros, que vivem nesse país do futuro onde o presente parece ser infinito. Mas eles não precisam de nosso reconhecimento, eles é que merecem o nosso pois mesmo derrotados em duas guerras, são a maior economia da Europa, líderes na indústria automobilística, química,médica e engenharia além de exímios filósofos, sendo o país de maior expressão após a Grécia Antiga. Já que não conseguimos nos separar desse time de futebol ao ponto de morrermos abraçados com ele e por ele, que pelo menos agora que estamos de cara no chão sentindo o gosto amargo da derrota, possamos nos envergonhar de perder tão fácil, estudar nossos pontos fracos, reforças as defesas, erguer a cabeça e trabalhar para que alcancemos esse Brasil do futuro. Assim, quem sabe um dia seremos um país sério onde o carnaval seja apenas uma festa comum do ano e não um estilo de vida.

Julho, 2014


Walter A.
tempo_moderno@hotmail.com / facebook.com/walterblogTM  

Comentários